Entrada não autorizada. Rejeitada. Suspeita fundada: falso turista. Com essas classificações, pelo menos 38 jovens brasileiros que queriam estudar em universidades da Argentina foram impedidos de entrar no país desde o começo deste ano.
O baiano Jailson Alves, de 20 anos, foi barrado no dia 1º de fevereiro. Orientado pela assessoria estudantil que o ajudou a se inscrever na universidade, ele disse no guichê de migrações que era estudante e que faria a faculdade de medicina na Universidade Nacional de Mar del Plata.
Mas, à diferença dos assessorados pela agência que entraram no país dias antes dele, Alves acabou barrado. “Primeiro eles me levaram para uma salinha, fizeram várias perguntas e me mandaram ler e assinar um papel. No final da ficha, estava escrito que minha entrada tinha sido recusada”.
“Parecia um pesadelo, porque nunca tinha acontecido com ninguém. Eu nunca tinha ouvido relatos de brasileiros sendo recusados de entrar na Argentina”, diz ele, que foi colocado no voo seguinte para Guarulhos, e teve que voltar a Salvador por conta própria e dar entrada em um visto de estudante no consulado argentino da capital baiana.
No último fim de semana, ele finalmente conseguiu entrar na Argentina. Dessa vez, com o visto de estudante no passaporte. Agora deu tudo certo, entrei com meu visto e segunda-feira eu já tenho prova”, disse no último sábado, antes do seu primeiro exame como universitário na Argentina.
Até o início do governo de Javier Milei, em dezembro do ano passado, milhares de brasileiros iam estudar no país vizinho entrando como turistas ou simplesmente afirmando que se inscreveram em uma universidade. Já no país, davam início ao trâmite para obter residência no país.
Desde 2010, a Argentina tem um visto para estudante, mas ele praticamente não era exigido. Segundo Alves, a própria faculdade pública mostrou não estar familiarizada com a documentação exigida para ele que desse entrada no visto. ”Eles não estavam habituados, e demorou um pouquinho para eles conseguirem ver como fariam a documentação”, relata.
O controle repentino confundiu quem queria vir estudar na Argentina e assessorias que ajudam os futuros alunos, e querem saber como será a inscrição em universidades que pedem que a inscrição seja pessoalmente, como a Universidade de Buenos Aires. Dona de uma assessoria estudantil que orienta brasileiros que querem estudar em Buenos Aires, Jéssica Pereira conta que uma cliente quase foi barrada no aeroporto em meados de janeiro.
“Ela apresentou documentação de que tinha dinheiro para entrar no país, cartão de crédito, eles queriam que ela assinasse um documento de que ela não tinha, ela tinha contrato de aluguel e demonstrou matrícula na universidade para entrar como estudante, eles afirmaram que ela não tinha os requerimentos para entrar como estudante. Mas o advogado apelou e conseguiu que ela entrasse”, relata.
Ela diz que a divergência de critérios não somente na entrada, mas também entre os consulados argentinos nas diferentes cidades brasileiras, tem deixado as assessorias estudantis e futuros alunos confusos. “Estamos tentando buscar orientações. Todo mundo está mandando e-mail, querendo saber mais informações, só que as informações estão divergentes”, lamenta.
Ela também ressalta que devido aos novos controles, alguns de seus assessorados perderam o prazo de inscrição na Universidade de Buenos Aires (UBA).Diante dos casos, o embaixador brasileiro em Buenos Aires, Julio Bitelli, se reuniu com o diretor do departamento de Migrações da Argentina, Sebastián Seoane.
“Eles não podem entrar com a documentação e a UBA não aceita representantes, nem com procuração. Então para fazer o visto, pedem inscrição da universidade, mas para fazer a inscrição, ele tem que estar no país, porque ele tem que entregar a documentação. Mas para ele entrar, precisa do visto. Então fica um looping eterno e a gente não sabe ainda como orientar as pessoas”, pontua.
“Entendemos que não há nada que indique que há discriminação ou tratamento arbitrário em relação a estudantes, ou potenciais estudantes brasileiros”, disse à CNN, pontuando que “os números de inadmissões não fogem ao que é habitual nesta época do ano.
Segundo o departamento de Migrações da Argentina, quando considerados somente os acessos por aeroportos, 23 brasileiros tiveram a entrada negada na Argentina como falsos turistas em janeiro e fevereiro deste ano. O número é praticamente o mesmo de 2023, quando 19 brasileiros não puderam entrar no país.
No total, considerando as fronteiras terrestres, foram 38 inadmitidos brasileiros neste ano, até o dia 25 de fevereiro. Como não foram deportados, esses brasileiros ainda podem tirar o visto de estudante no Brasil e voltar a entrar na Argentina.
“Para estudar na Argentina, precisa ter visto de estudante. Então, segundo nos disse o Departamento de Migração, o que faz todo sentido, é que você não pode vir meio como estudante, meio como turista. Ou você entra como turista, ou entra como estudante. Mas se você não tiver o que requer a norma, você é inadmitido”, esclarece Bitelli.
Para entrar como turista na Argentina, os passageiros precisam ter passagem de volta para o Brasil, demonstrar onde se hospedarão e que tem condições financeiras para arcar com essa estadia no país. “Isso é o que foi pedido para alguns desses inadmitidos e as pessoas não tinham como cumprir esses requisitos.
“Talvez haja agora uma aplicação mais rígida da regra, mas isso é uma questão argentina. Se antes havia um certo relaxamento, isso não dá direito a ninguém que queira entrar no país de descumprir os requisitos legais”, conclui Bitelli.